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Missionários americanos são mortos em Porto Príncipe

Um confronto entre gangues no Haiti deixa três mortos e uma casa em chamas. E a intervenção das forças internacionais ainda é aguardada.
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Missionários americanos são mortos em Porto Príncipe
Image: Missions in Haiti
Davy (à esquerda) e Natalie (centro) Lloyd trabalhavam em um orfanato no Haiti desde 2022.

Dois jovens missionários americanos foram assassinados no Haiti no dia 23 de maio, em meio à crise contínua da violência de gangues que assola o país.

Davy e Natalie Lloyd, bem como Jude Montis, membro da equipe haitiana e líder de igreja, foram emboscados por três caminhões cheios de membros de gangues, na saída de um culto do grupo de jovens, em Porto Príncipe, de acordo com a página do Facebook da organização Missions in Haiti [Missões no Haiti]. Enquanto homens armados roubavam vários veículos, nos quais colocavam o que era saqueado da missão, outra gangue chegou e os dois grupos entraram em confronto violento.

“Não tenho certeza do que aconteceu, mas alguém foi baleado, morreu, e então essa gangue começou um ataque generalizado”, escreveu um missionário que recebia nos EUA relatos dos acontecimentos. “Davy, Natalie e Jude [estavam] na minha casa, no fundo da propriedade, usando a internet Star Link para me ligar. Eles estavam escondidos lá, e as gangues começaram a atirar em todas as janelas da casa e não paravam de atirar.”

A organização Missions in Haiti teria tentado entrar em contato com a polícia haitiana, sem sucesso. Então, as linhas telefônicas caíram.

“POR FAVOR, OREM”, pediu a organização aos seus 4.500 seguidores no Facebook. “Vai ser uma longa noite.”

Por volta das 21h, a casa [em que os missionários estavam] estava em chamas e Davy e Natalie Lloyd, bem como Jude Montis estavam mortos.

Jude tinha 45 anos. Davy tinha 23. Natalie, 21.

“Meu coração está partido em mil pedaços”, escreveu Ben Baker, pai de Natalie e deputado estadual pelo estado do Missouri. “Nunca senti uma dor como essa.”

Gangues criminosas mataram perto de 5.000 pessoas no Haiti no ano passado. Depois, em 2024, as gangues uniram-se, voltaram-se contra os políticos que antes colaboraram com elas por poder, e empreenderam ataques coordenados contra o governo. As gangues incendiaram delegacias de polícia, fecharam o aeroporto principal e o porto marítimo e invadiram duas prisões, libertando cerca de 4.000 presos. Vandalizaram escritórios do governo, invadiram o Palácio Nacional e assumiram o controle de cerca de 80% da capital.

“Hoje, elas são um poder em si mesmas”, disse à Associated Press Robert Fatton, professor de governança e relações exteriores na Universidade da Virgínia. “A autonomia das gangues atingiu um ponto crítico. É por isso que, hoje, elas são capazes de impor certas condições ao próprio governo.”

O primeiro-ministro renunciou em abril, e foi criado um conselho governamental interino, que ficou encarregado de reprimir a violência e restaurar a ordem.

Uma missão de paz aprovada pela ONU, composta por 1.000 agentes da polícia queniana, está sendo reiteradamente adiada. Duzentos deles deveriam chegar no Haiti na quinta-feira (23 de maio) — quando o presidente queniano, William Ruto, reuniu-se com o presidente dos EUA, Joe Biden, na Casa Branca —, mas o voo de Nairóbi foi cancelado no último minuto.

Os policiais não receberam nenhuma explicação para o atraso e foram orientados a aguardar, segundo a Reuters, porque poderiam embarcar a qualquer momento. Autoridades dos EUA disseram que a força não possui os veículos blindados, helicópteros, armas e equipamentos de comunicação necessários para a operação.

O governo americano alocou 300 milhões de dólares para a missão. Desde abril, os EUA evacuaram centenas de cidadãos americanos com helicópteros e muitas organizações sem fins lucrativos também coordenaram planos de evacuação de emergência. Nem todos puderam sair, porém, e alguns optaram por não fazê-lo.

A organização Missions in Haiti disse a seus mantenedores, em março, que a sua área de Porto Príncipe estava tranquila e que os missionários não estavam preocupados com a sua segurança.

A organização foi fundada pelos pais de Davy Lloyd, David e Alicia, em 2000. A missão atende principalmente crianças — oferecendo comida, educação e orientação espiritual. Em 2002, cerca de 100 crianças frequentaram o programa de escola bíblica de verão da missão e, naquele outono, havia 10 crianças no orfanato e outras 30 matriculadas na escola.

Em 24 anos, a escola cresceu e passou a atender mais de 400 crianças por ano, de acordo com relatórios divulgados aos mantenedores. E a missão também se expandiu, plantou uma igreja e abriu uma padaria que emprega alunos que se formaram.

A escalada da violência no Haiti, no entanto, começou a preocupar seriamente David Lloyd em 2022.

“Não existe um governo que funcione, a nação do Haiti está em total anarquia”, escreveu o velho Lloyd. “Essas gangues assassinam, estupram, roubam e destroem à vontade.”

Ele relatou que sua organização quase foi dominada por “uma das gangues mais perversas”, mas “caímos de joelhos e Deus interveio de forma milagrosa, e fez com que aquela gangue se afastasse!”

Os missionários permaneceram esperançosos e pediram a seus mantenedores que orassem e escrevessem aos políticos nos EUA.

Davy e Natalie Lloyd ingressaram na organização em 2022, depois de se formarem no Ozark Bible Institute, uma escola pentecostal da Holiness, e se casarem.

Davy, que cresceu na missão, dedicava-se a projetos de manutenção, reformando banheiros de dormitórios, consertando veículos e construindo uma nova lavanderia.

Ele disse a mantenedores que, quando voltou para lá, pôde ver os problemas maiores que assolam o Haiti com mais clareza do que quando era criança e ia à escola e à igreja, cuidava das galinhas e brincava com seus amigos haitianos.

“Meus olhos estão mais abertos”, disse o jovem Lloyd, em um vídeo compartilhado pela Missions in Haiti. “Realmente, precisamos de um milagre. Precisamos de um mover de Deus.”

Natalie trabalhava no orfanato e cuidava das crianças. Ela compartilhou imagens do ministério no Instagram do casal: pintando equipamentos do playground, dando mangas e cocos às crianças e ensinando-as sobre a plena armadura de Deus.

A jovem missionária expressava certa preocupação com a situação política no Haiti, mas se concentrava mais no seu prazer em servir as crianças e na sua confiança em Deus.

“Deus é sempre fiel a suas promessas. Ele é imutável, nunca vacila”, escreveu ela. “Quero colocar minha esperança Naquele que nunca falha, Naquele cujas misericórdias se renovam a cada manhã, Naquele que, enquanto mudam as estações, permanece o mesmo”.

Poucos dias antes do ataque das duas gangues, os missionários expressaram esperança de que a ajuda estava chegando e de que a ordem poderia ser restaurada em breve. Eles viram aviões militares dos EUA sobrevoarem a área várias vezes ao dia, provavelmente trazendo equipamentos para as forças quenianas. O aeroporto foi reaberto e a atividade das gangues parecia estar diminuindo, de acordo com a página do Facebook da missão.

“O domínio das gangues pode terminar em breve”, escreveu David Lloyd. “Estamos orando para que isso aconteça, e quanto mais cedo melhor. Obrigado por suas contínuas orações.”

Na tarde de sexta-feira, familiares relataram que os corpos de Davy e Natalie Lloyd haviam sido transferidos para a embaixada americana.

Correção: Uma versão anterior desta notícia dizia que o orfanato foi incendiado. Na verdade, foi a casa de um missionário, e não o orfanato, que foi incendiado.

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